domingo

Dandismo à portuguesa

O dandismo à portuguesa do III milénio nada tem a ver com o dandismo do séc. XIX, em que o desejo de singularidade se manifestava em homens de cultura, escritores, poetas numa atitude de verdadeira tradição literária: Garrett, Nobre, Mário Sá-Carneiro foram alguns desses expoentes da tradição cultural portuguesa oitocentista. Nobre até fez a Balada do Caixão, em que o poeta escolhe cuidadosamente o fato com que se há-de apresentar a Dona Morte, dizendo: (...) Ó meus amigos! salvo erro, Juro-o pela alma, pelo Céu: Nenhum de vós, ao meu enterro, Irá mais dandy, olhai! do que eu.
Hoje, ao invés, temos políticos que recorrem ao tabú como forma de fazer política caseira, pensando assim criar suspense no eleitorado e alguns atletas julgam-se tão importantes que até supõem que a personalidade das mulheres com quem dormem ou copulam é de relevo social tal que entendem divulgar a necessidade de manter privada a sua identidade.
Ora, tirando o povinho iletrado que ainda acredita nos milagres dos xeréns algarvios e em miúdas em fase de puberdade que ocupam as paredes dos seus quartos com posters de futebolistas broncos, creio que a maior parte da população portuguesa não tem, ou não deveria interessar-se, por temas que não merecem nenhuma atenção.
Mas este tipo de notícias - por ainda serem veiculadas - revela bem o povinho fútil que ainda somos. É pena.
Pois para mim mais vale um arroto de Mário Sá-Carneiro - que queria que batessem em latas e que as pessoas (i)rompessem aos saltos e aos pinotes quando morresse - do que os tabús manhosos e eleitoraleiros de certos políticos de paróquia ou as declarações egocentricas de futebolistas-broncos que povoam a paisagem mediática das sociedades contemporâneas autofágicas que alguns criaram e laboriosamente alimentam.
Esta vontade inaudita de ser singular leva certas pessoas a escarrarem para uma camara de tv quando, na verdade, esse gesto apenas esconde a fraca representação neste Mundial de futebol.

Etiquetas: