sexta-feira

Explicação eventual do sucesso de Fernando Pessoa


Creio que Fernando Pessoa foi o poeta que melhor conheceu e reinventou o pensar e sentir desta raça lusitana à beira mar plantado, que umas vezes tem destino, outras está à beira do precipício. Pessoa foi esse criador de mitos, o maior dos milagres que é possível fazer pela humanidade, como dizia. Dizia também: que não era nada... apenas uma ficção (A. de Campos).
 
E nós, todos nós, o que somos?!
 
A partir duma ficção sobre o real, Pessoa foi compondo e recompondo personagens, mitos, narrativas, ficções literárias destinadas a dar-nos uma ilusão da realidade. Pessoa tonou possível e visível todas essas ausências ontológicas do nosso Ser, daí ter-se desmultiplicado na conhecida assembleia de heterónimos que fizeram história, engrandecendo a própria história da literatura mundial, nessa excepcional invenção de "eus-outros" tão fictícios e tão reais como o "eu" que responde pelo próprio Fernando Pessoa.
 
Creio, pois, que é a essa imensa família que o poeta de Mensagem e da Ode Marítima que o universalizou. "Filhos" como Álvaro de Campos, Bernardo Soares, Ricardo Reis, Caeiro e outros - todos habitam, hoje, o anonimato de cada um de nós nesta nossa modernidade.
 
Consequentemente, o génio de Pessoa consistiu nesse trabalho de antecipação heteronímica, que multiplicou máscaras sobre o rosto do nosso nada. E ao fazer as coisas desta forma não ocultou nem limitou o nosso ser. Apenas nos ajudou a brilhar revelando aquilo que verdadeiramente somos, neste ser e não ser repleto de contradições registadas pelo passar do tempo.
 
Pessoa viveu esse jogo como a aposta da sua vida mas, ao mesmo tempo, desconfio que não se tenha dado conta que estava a definir as essências não apenas de um povo, mas da própria condição humana em toda a sua extensão.
 
A esta luz, Pessoa foi, de facto, um verdadeiro psicólogo da humanidade.
 

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