O Político por Platão. Acerca da corrupção
Cronos, devorando um de seus filhos (Goya)
Num dos diálogos de Platão - O Político - , a Idade de Ouro era regida por Cronos, que fez gerar os homens na terra, seguida pela idade de zeus, correspondente à nossa era de corrupção. Uma fase em que o mundo foi abandonado pelos deuses aos seus própios recursos. Foi isto que me evocou a medida (tardia) do ministro da Justiça, Alberto Costa - que não se sabe o que anda a fazer ou sequer se existe. Talvez esta seja a sua principal medida: lançar uma broxura apelando a uma cultura anti-corrupção na sociedade e no Estado, a qual poderá ter efeitos eprversos... Mas esse relato de Platão sugere também que uma vez atingido o climax da corrupção, o deus de serviço poderá reassumir os comandos dessa nave cósmica e inaugurar uma nova era de progresso. Confesso que não vejo o dr. Alberto Costa neste papel: nem a conduzir um carrinho-de-linhas (dizendo baixinho - este não é o meu ministério...), quanto mais uma nave cósmica à la Espaço 1999 do Mr. Spock... Mas outro, mais folgadamente, poderá levar a bom porto essa missão que até deveria ser erigido a desígnio nacional, mas nunca pondo funcionários contra funcionários, gerando um ambiente de macCartismo na Adm. Pública em Portugal deixando sempre de fora os tesoureiros e os secetários-gerais dos partidos, ou seja, desculpando sempre os "antónios pretos" dos partidos políticos e sacrificando sempre o mexelhão... O que também seria "giro", porque depois teríamos uma caça às bruas em cada repartição de finanças, tesouraria ou notário - que são os craques nessa onda de luvas à Tony Preto.
Não sei se hoje vivemos uma fase de depravação corruptiva em Portugal, nem se haverá estudos fiáveis sobre a matéria, já que a corrupção é, por natura, um crime oculto, invisível praticado no biombo dos interesses e dos arranjinhos de bastidores para beneficiar duas ou mais pessoas em detrimento do bem comum. Mas proponho aqui aquele mecanismo usual no Far-west em que se concede um avultado prémio pecuniário aquele/s que contribua para identificar esses criminosos de colarinho branco que fazem da economia real uma verdadeira economia paralela. E isto pode até começar pelos chefes de secretárias de escolas e de universidades que escolhem - a olho - os fornecedores que depois abastassem essas instituições de material e equipamento escolar. Isto para começar por baixo, mas reconheço que a luta é difícil por uma razão biológica, congénita: a tendência do homem, desde que nasce, é a da sua própria decadência: física, intelectual, humana, moral (em certos casos)...
Tudo factores que propulsionam, directa ou indirectamente, esse caldo de cultura facilitadora da corrupção nas mais variadas instâncias do poder: na sociedade, na economia e no Estado. Desviar esse curso inexorável da história e da própria condição humana pode (e deve) ser tentado, melhorado e aperfeiçoado, mas não tenhamos ilusões: o capital corruptor é-nos inato, fomos (biológicamente) feitos desta maneira e não doutra. Não nos conseguimos reprogramar (so far..) e pedir aos deuses que de canalhas e mafiosos passemos ao bom selvagem do Rosseau. Assim, podemos limitar os estragos à sociedade, mas nunca erradicaremos esse capital genético sinónimo da nossa verdadeira decadência que culmina no fim trágico que sempre nos acontece. Com a agravante de nunca sabermos quando ele ocorre. É aquilo a que chamo uma morte sem aviso-prévio. Que, quando sucede, comporta a desvantagem do próprio já não se poder queixar ou explicar aos que ficam para onde foi. Portanto, a existir enigma é o da morte, nunca o da corrupção (que será sempre recriada, reinventada e fugirá sempre à frente da lei). Seria bom que quando combatessemos a corrupção também estivessemos a adiar a morte, talvez assim alcançássemos bons resultados...
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