Evocação de Freud
Devo muito do pouco que sei a Freud. Tenho a vantagem de o ler há décadas. Com prazer e autoreconhecimento. Ainda hoje o seu legado representa uma trave-mestra da nossa civilização: no melhor e no pior sentido, razão por que aqui hoje o evocamos. Tanto mais que se vive em permanente tensão, conflitos e guerras entre os homens, os povos, os Estados. Aí se poderá ver um traço do mal-estar da nossa querida civilização. É precisamente aí - na fonte do mal-estar da civilização - que Freud investigou as causas do sofrimento humano e as formas de lidar com ele. E segundo o psiquiatra de Viena o motivo básico desse mal-estar remete para os nossos instintos - que estão - como se sabe - em contradição com o mundo. E é desse choque, desse desencontro de vontades e de instintos que irrompem as frustrações, as zangas, os conflitos - até às guerras abertas - que começam sempre no coração dos homens, como diria o Papa João II - de quem este é uma sombra-Gucci e perfume Armani mas que, no fundo, nem uma Lavanda de 7ª categoria reflecte nos odores do mundo. Então se aplicarmos esta grelha de análise ao actual conflito do MO - que opõe Israel aos Estados árabes mais radicais (Irão, Síria e Líbano) poderemos constatar que uns cegam com o poder de fogo de quem dispõem (Israel) e outros vivem amargurados e frustrados pela condições socioeconómicas a que o Ocidente - secularmente - os votou. É daí que nasce o resentimento que leva à guerra, e tudo o mais que se diga é mera música celestial e poeira para os olhos. Ante isto, parece que existem três saídas para boa parte dos conflitos entre os homens: 1) desistir dos desejos de expansionismo; 2) usar um desejo susbstituo; 3) ou fugir à frustração. Para sermos sinceros, nenhum de nós estará a ver Israel ou a Hezbolla observar cada um ou os três daqueles pressupostos. Ao primeiro corresponderia um objectivo da filosofia e de algumas religiões; ao segundo - o prazer sucedâneo - poderia ser encontrado pela ciência ou pela realização artística nessa arte do sublimar (ou "sublimanço" - como diria um amigo meu) - tarefa do espírito. Por último vem a fuga... Ninguém pensa que um israelita ou um árabe que se preze incorre nela... Ninguém!!! Mas se ela porvir - far-se-á pela via da loucura - em que tanto uns como outros da contenda - fingiriam ser loucos durante um período transitório - enquanto se fixava a paz. E aqui tanto a filosofia como a religião poderiam desenvolver um papel crucial na engrenagem dessa fuga racional e premeditada - sem ser por recurso a drogas. O ponto é que, segundo o genial Freud - todos nós usamos algumas dessas soluções pela vida fora. Mas é o AMOR a "arma" mais potente e eficiente para a realização desses desígnios no jogo perigoso entre a Paz & Guerra que hoje todos testemunhamos, e com tantas perdas humanas tão lamentáveis quanto gratuitas. Mas ressalta um problema, que se coloca quando queremos dançar o tango: it takes two... E arranjar aqui um parceiro para negociar ou fixar condições de paz é como chover no molhado. O árabe crê firmemmente que o israelita judeu é a encarnação do mal; o israelita tem a certeza que o árabe fanático não passa duma erva daninha que urge aniquilar definitavamente da face da terra. E tudo isto se passa neste jogo de perspectivismo ou relativismo cultural que nos dá a imagem da dimensão do problema que se inscreve alí no MO - para onde convergiram as três religiões do livro, as rotas do petróleo, as armas e os santuários terroristas que depois atacam em rede neste contexto de globalização competitiva deste nosso mundinho. Sucede que todas essas formas para superar o sofrimento comportam desvantagens: pelo amor pode-se ganhar um desamor ainda maior se ele não for correspondido; pela sublimação da componente artística ou científica depende os talentos individuais, mas estes só se afirmam em clima de paz, e não em ambiente de bombas. Infelizmente, a religião - naquela conturbada zona do mundo - só infantiliza, pois aqueles fanáticos querem fazer crer às moscas que o Al Corão estipula a violência que eles proclamam... Que infantilidade!!! Infelizmente, se olharmos com olhos de ver e de compreender o filme dos acontecimentos do que alí se passa há décadas, desde a fundação - problemática - do Estado hebreu em 1948 - mesmo ao lado dos árabes - só podemos concluir que os decisores políticos ou são estúpidos ou desejam a guerra. Ou então estavam todos drogados como certos júris de prémios nobeis da literatura quando atribuem distinções a quem não as merece. Em resultado dessa disfunção do mundo - parece que hoje todos andamos drogados - em que uns cobram o preço nos efeitos colaterais da pior forma possível e imaginária: pela destruição sistemática do homem e das suas criações. Meus senhores, a lição que Israel e os seus vizinhos radicais estão dando ao mundo é só uma: a da degração física e da civilização. E só por isso se coloca aqui uma questão metafísica: será que eles têm, de per se, - o direito de existirem - dado não serem capazes de superar os seus impulsos mais primários e destrutivos?
- Post dedicado ao legado de Freud - e pelo muito que aprendemos com ele.
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