quinta-feira

Capa da Visão

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Esta imagem faz hoje a capa da revista Visão. Podia ser mais uma notícia sobre o mundo, mas não é. É uma triste notícia dando conta do desaparecimento de um homem - que trabalhava nessa mesma revista - que hoje serve de veículo ao fim dessa existência. Amamos, desamamos, sentimos pena, compaixão, cooperamos, conflituamos, estendemos a mão para a retrair logo de seguida; promovemos uns, entorpecemos outros, somos tudo isso. Somos homens programados genéticamente para toda essa amálgama, até para morrer. Somos, de facto, animais simbólicos, e tudo seria bem mais fácil - neste e em qualquer outro desaparecimento, se não tivéssemos memória; se não fôssemos animais simbólicos, embora de carne e osso e rápidamente perecíveis. Assim é o homem; assim é a nossa condição humana: está, mas não está; num jogo de ausente-presente. É aqui, no jogo perigoso da vida e da morte - que a democracia directa exerce a sua mais poderosa regra igualitária, sem truques nem simulacros sobre conflitos de classe ou de género. Premiando (com a vida) mas tolhendo (com a morte) todos por igual. Só mudando a qualidade do caixão, a quantidade de flores ou a nobreza do jazigo. Por vezes sucede deixarmos, num ápice, de responder à chamada... E é aí que tudo emudece, sem imunologia possível. Lá fora, o barulho de sempre, como se nada fosse; como se a Revolução Industrial ainda estivesse no auge e, no entanto... De facto, independentemente da projecção na esfera pública de cada homem, cada um de nós é uma experiência irrepetível, singular no espaço e no tempo numa equação única. Talvez por isso John Donne, poeta inglês, tenha dito de forma eloquente: Nenhum homem é uma ilha, contida em si mesma; (T)oda a morte de um homem me diminuiu, porque sou parte da humanidade, e por isso nunca mandes perguntar por quem o sino dobra; ele dobra por ti. Foi também isto que senti com o desaparecimento de Cáceres Monteiros aos 57 anos. A morte é aquela verdade fatal aguardando vez para tornar inúteis os nossos BI e cartões pessoais. E todos estamos inscritos, sempre desconhecendo quando sobrevem a ordem de chamada... E assim como partimos, também nunca percebemos bem porque viémos. Será este o risco da vida - suportado pelo fardo da morte!? É um mistério.. PS: dedicamos esta simples reflexão a todos quantos fizeram daquele projecto editorial aquilo que ele é hoje, e que semanalmente fazem as nossas alegrias e tristezas - que ameaçam perpetuar-se no futuro. Por ser essa a nossa condição: viver e morrer.