O novo Alegre e o apoio socialista
Foi um Manuel Alegre diferente, o pré-candidato presidencial que se mostrou na entrevista de ontem ao jornal Expresso. Sobretudo no discurso. Desta vez, ao contrário do que aconteceu quando foi para a estrada sem o apoio socialista, o poeta escolheu um alvo preciso: Cavaco Silva. Tirou-lhe as medidas, escolheu-lhe os pontos mais fracos (na sua perspectiva) e apontou mira à sua tentação executiva: "O Presidente não pode ser um segundo primeiro-ministro." Sócrates gostou das palavras, já o disse. E não haja dúvidas: este Alegre é, para a actual direcção do partido, bastante mais fácil de apoiar.
Para isso, muito contribui outra lição aprendida pelo histórico militante do PS. Face à actual conjuntura, Manuel Alegre reconhece agora que não é fácil aos socialistas chamar para negociações do próximo Orçamento do Estado os partidos mais à esquerda. Diz agora que estes, PCP e Bloco, têm dificuldades em reconhecer a economia de mercado. E, assim, acaba de dispensar Sócrates de procurar, nessas matérias de regime (essenciais para a sobrevivência do próprio Governo) uma negociação que teria um fim assegurado: o fracasso. Uma vez mais, Sócrates agradece.
O novo Manuel Alegre, assim sendo, coloca-se ao centro no terreno político. A estratégia fará sentido, sobretudo para garantir o que o recandidato não pode dispensar: o apoio do PS. Mas também para disputar o Palácio de Belém no mesmo território que o próprio Cavaco Silva.
O risco, para Alegre, será o de não garantir o entusiasmo que a sua candidatura de 2006 recolheu nas presidenciais onde ganhou mais de um milhão de votos. Mesmo que, como dizia ao Expresso, o PCP nunca tenha contribuído para prejudicar a esquerda numa corrida a Belém. Mas mais do que isso, o que importa a Alegre é ter outros entusiastas: os do aparelho do próprio PS. É que sem isso, mesmo com o apoio formal de Sócrates, dificilmente ele terá condições de vitória.
PS: Digamos que o poeta Alegre já não está apenas a por-se em bicos de pés, saltou para o andaime, e aí assumiu as suas novas funções de "testa-de-ferro" informal do PS e de Sócrates - na limitação ao campo de acção de Cavaco na corrida a Belém, em 2011. Contudo, o problema de Alegre é o de sempre: que projecto? Que fazer com o poder? Manuel Alegre, em rigor, faz poesia. Eis o drama daquele que procura fazer política só sabendo fazer poesia.
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