quinta-feira

O G20 e o "carnaval" antiglobalização da era Brown e Obama. Oasis e Mesa

Eram previsíveis as manifestações que antecedem a reunião de cúpula do G20. É já um clássico da história política antiglobalização, em que os manifestantes, em qualquer capital europeia que represente o capitalismo, furem a segurança e provoquem desacatos, desenvolvam combates de rua, e não combates de ideias, pois muitos deles são "tropas de choque", enquadrados por ONGs e Movimentos Sociais (curiosamente) subvencionados pelos Estados - que alí combatem nas ruas, montando cerco quer às autoridades policiais quer aos edifícios ondem têm lugar as tais cimeiras dos países mais ricos (e emergentes) do mundo, que representam cerca de 90% do PIB mundial.
Portanto, estranho seria não ocorrerem desacatos e vidros partidos, e algumas cabeças esfoladas para dar sangue ao momento e avivar a luta contra o neoliberalismo que nos conduziu ao estado a que chegámos: uma economia global sem confiança, a não crescer e a gerar diáriamente milhares de desempregados que, por sua vez, provocam outros tantos dramas sociais na roda dentada da engrenagem da economia globalizada.
Daí a razão de ser dessas manifestações na City de Londres, para protestar contra um sistema económico que beneficia uma minoria de agentes económicos que nenhuma riqueza produzem para o bem comum. A esta luz, a fundamentação da manifestação é legítima, o que já não é legítimo é a violência exercida contra bens patrimoniais que sistemáticamente é feita por essas ocasiões, numa espécie de catarse colectiva e de violência das massas num gesto típico das multidões em fúria que vêem alí o seu grande momento de riscarem contra o sistema capitalista global.
Estas cimeiras do G20, no fundo, propiciam o momento da grande órgia anticapitalista.
Num dos slogans lia-se: castigo aos saqueadores, ou seja, aos CEOs de grandes empresas, aos especuladores e a todo um conjunto de agentes e operadores económicos e financeiros que apenas têm do mercado uma ideia de lucro selvagem. Desta vez, foram os bancos que pagaram a factura dos vidros partidos, o Royal Bank of Scotland sofreu essa maldade como forma simbólica de os manifestantes antiglobalização poderem dizer "NÃO" aos banqueiros do mundo - que responsabilizam pela crise económica. No fundo, os responsáveis pelos seus desempregos e pelo empobrecimento colectivo acelerado a que foram votadas as sociedades dos dois lados do Atlântico.
Esta é uma guerra contra o modelo económico neoliberal vulgarmente cunhado de globalização predatória (o termo é do internacionalista Richard Falk), que grassa desde 1999 e cuja virulência, como vemos, não cessa de crescer. O bode expiatório não poderia estar melhor representado senão no antiliberalismo, se bem que a era Obama - veio subtrair a esse movimento antiglobalizador o estigma do império americano que o actual presidente, por ser negro e ter uma personalidade verdadeiramente excepcional, veio esbater.
Recordo que na cimeira de Seattle, em 1999, contra a OMC, podia ler-se numa das bandeiras: A privatização mata; o capitalismo mata.
Naturalmente, os homens cultos e influentes do Le Monde diplomatique, com o famoso Ignatio Ramonet à cabeça, pegaram nisso e disseram que a globalização provocaria o alastramento global da pobreza em benefício duma minoria de ricos que se tornariam cada vez mais ricos.
Nesse sentido, todos somos marxistas, porque essa tem sido a verdade, razão por que em relação ao futuro terá de haver um sistema múltiplo de regulações que vigie os operadores económicos e financeiros dos excessos e da ganância que nos empurraram para o ponto em que estamos hoje: Europa e América e o mundo em geral - que não sabe o que há-de fazer aos produtos tóxicos que as contabilidades criativas das grandes multinacionais e dos operadores financeiros internacionais geraram nos últimos 10 anos.
Não foi por acaso que em 1999, nas manifestações antiglobalização de Génova, de Gotemburgo, de Nice e de Seattle, o socialista Lionel Jospin saudou a emergência de um movimento de cidadãos à escala planetária. Então recordo que Jacques Chirac seguiu-lhe a pegadas.
Embora haja o risco dessas manifestações conduzirem as dinâmicas sociais e de segurança a um ressurgimento minoritário da violência antidemocrática. Precisamente, pelos excessos de parte a parte que são inevitavelmente cometidos nesse tipo de confrontos físicos.
Contudo, não me parece que os manifestantes estejam a dar um contributo positivo para a valorização da reunião do G20, ao atacarem a democracia substituindo-a pela força das ruas, seguindo uma tradição revolucionária que hoje não resolve os problemas sociais, económicos, ambientais e financeiros do mundo contemporâneo.
Estes manifestantes, no fundo, ainda não pararam para pensar por um momento, pois se já o tivessem feito teriam concluído que a aspiração à implementação democrática de um projecto antiglobalização, a que supostamente teriam direito, além de ser incoerente no plano das ideias, acabaria por representar um retrocesso histórico.
Hoje a complexidade dos problemas exige mecanismos e racionalizações que nenhum contributo podem colher dessas cenas de vandalismo primário que reflecte os sentimentos humanos mais básicos do homem, e que, levado ao limite, apenas os conduziria à lenda da guerrilha urbana cujos resultados, históricamente, também nunca foram famosos.
Numa palavra: os manifestantes antiglobalização na City londrina têm de compreender que a história já não se faz com cabeças partidas e umas gotas de sangue captadas pelas câmaras da mediacracia global que exploram todos os ângulos mortos dessas cegadas, mas trava-se com ideias inovadoras e criativas que posssam regular a desordem da economia e da finança global que escavacou a confiança - que é o cimento social que motoriza toda a economia.
O problema é que se todos e cada um daqueles pequenos vândalos que se encontram a berrar naquelas manifestações fossem um dos ricos que criticam pelo estado do mundo a que chegámos, ainda seriam piores do que eles. Porque à avareza que têm em comum com os ricos, somar-se-ía a violência primitiva dos pobres, dos excluídos e dos invejosos entregues à sua própria fúria animados por uma tremenda sede de vingança.
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Oasis - I'm Outta Time

Mesa @ Fnac - 30.04.2008 - Quando As Palavras não dizem o que somos