terça-feira

A Política: filosofia, ciência e senso comum

Sabemos que a política é uma permanente "construção" humana que diz respeito a todos nós. A sua dimensão prática é muito importante: a práxis, o "fazer". Só que esse fazer é precedido de um discurso - acerca do que (e como) fazer. E é aqui que começam os problemas e os desentendimentos.
Por conseguinte, a acção do homem que faz é precedidia pelo homem que pensa. Chegamos ao tal homo loquax. Nesta medida, a política tem origem nesse tal discurso acerca do que se pretende fazer e é aí que encontramos três fontes distintas: a filosofia política, a ciência ou conhecimento empírico da política e senso comum assente no tal discurso comum sobre a política.
Vamos por partes. A filosofia política - ou as filosofias da política são a principal fonte inspiradora da teoria política. Os problemas são enunciados com base nas suas formulações teoricas e especulativas que permitem ao homem uma aproximação aos problemas da polis. O marximo é talvez o mais evidente tipo de filiação directa de acção política vinculado a uma filosofia (política). Embora Karl Marx tenha desenvolvido o seu sistema de pensamento por relação ao pensamento de Hegel. Pelo que a própria concepção marxista nos seus conceitos-chave são, no seu mecanismo lógico, uma elaboração (invertida) da filosofia hegeliana. Portanto, aqui a homenagem recai em Hegel.
Já a ciência política permite-nos um conhecimento empírico da política validando-a. E aqui Aristóteles, Nicolau Maquiavel, Hobbes e outros deram um forte contributo para a elaboração da doutrina da razão de Estado, autonomizando o saber da ciência da política conferindo aos factos e ao domínio sobre a realidade um saber menos hipotecado à filosofia política, de natureza mais especulativa. Pelo que a pressão para a prática da política acelerou o processo de consolidão da própria ciência política, enquanto dimensão empírica que permite ao homem, por meio da linguagem e das ideologias, resolver os problemas da polis.
Em terceiro lugar vem a tal dimensão mais comum da política. A conversação "ordinária" da política muitas vezes cunhada de "conversa de café" a que todos os "treinadores de sofá" têm direito. Embora vejamos com alguma frequência os supostos analistas praticarem esta "arte". Seja por sectarismo, presunção ou um interesse subjectivado num dado assunto de que são parte. É aqui que os dircursos emotivos se evidenciam transformamdo-se em discursos ideológico-emotivos. Quando isto acontece diz-se que as emoções tomam conta das racionalizações no terreno da luta política, que é o que já está a acontecer no espectro politico-partidário em Portugal.
Quando Jerónimo de Sousa do PCP ou mesmo Anacleto Louçã do BE assumem os papéis dos sindicalistas de serviço nas manifs - substituindo-se ao próprio movimento sindical estamos diante desta categoria de política profundamente emocionalizada. Donde resultam as paixões, as comoções e toda uma forma subjectiva de pensar e praticar a política que visa apaixonar as massas, exacerbá-las e, naturalmente, atraí-las ao seu próprio reduto politico-ideológico que hoje é sériamente disputado entre o PCP e o BE. Diria até disputado duma forma quase fratricida, dado o radicalismo de ambos e pelo facto de comungarem alguns aspectos de concepção e cosmovisão do mundo e de organização da sociedade. Pontos comuns que só os distanciam porque reclamam o mesmo eleitorado, que é limitado.
E é nessa proximidade que radica boa parte do seu próprio ódio recíproco entre PCP e BE, mas não desistem de coabitar nos mesmos espaços de contestação social, como na manifestação da CGTP do passado fim-de-semana a fim de engrossar a sua vox e agremiar mais uns votinhos para sua causa partidária. No fundo, a oposição já anda em eleições há mais tempo do que o Governo. Ora isto nada tem de filosofia política nem de ciência política. Isto reflecte a dimensão política na sua deriva mais emotiva a fim de exaltar as massas que, como sabemos, já está confrontada com sérios problemas sociais e laborais agravados com a recessão global que varreu o mundo e que teve o seu epicentro na finança e depois se estendeu à esfera da economia ameaçando depois a coesão social em toda a Europa (e nos EUA).
Naturalmente estas três componentes da Política (filosofia, ciência e senso comum) não convergem entre si. Ao invés, são divergentes e até conflituantes. Formando obstáculos recíprocos uns aos outros. Por isso é que os processos e as dinâmicas políticas são conflituosas por natura. Por exemplo, hoje não vemos os economistas em Portugal entenderem-se quanto à eficácia dos investimetos públicos. Cada economista pensa uma coisa diferente: uns acham que o aeroporto internacional de Lisboa e o TGV fazem falta ao País; outros acham-nos infra-estruturas dispensáveis. E os empresários, por maioria de razão, além de que são partes interessadas nesses projectos, revelam posições completamente contraditórias (consoante a sua localização e/ou tipo de negócios que têm) nessa matéria de investimentos públicos. Cada cabeça sua sentença. Cada pessoa ou corporação é uma "ilha" (de interesses).
E a Manuela Ferreira leite até já inventou um termo novo: "investimentos de proximidade", quiça por analogia à segurança de proximidade que o Verão de 2008 demonstrou a forma ausente como lidou com o crime em Portugal (hibernando).
Esta organização tripartida da política serve, afinal, para demonstrar que os agentes políticos, em função da sua posição estratégica e orientação ideológica, escolhem a ordem especulativa ou a filosofia politica (por vezes politiqueira) que pretendem desenvolver, concebem a sua dimensão empírica de aproximação aos problemas e, por fim, tecem os comentários de senso comum que o problema suscita.
Ora, com a complexificação dos problemas, a exigir cada vez mais uma elevada tecnicidade que parece não dispomos, a incerteza aumenta entre a comunidade dos experts, o que faz com que as contradições aumentem no espaço público e as polémicas estalem.
Seja como for, aquilo que hoje parece evidente em Portugal é que a oposição apenas se destaca pela negativa. Chefes de oposição assumem os papéis de sindicalistas de serviço, a CGTP não se consegue distinguir do PCP, quando Jerónimo fala não se sabe se fala em nome do militante comunista que elegeu deputados da côr para o Parlamento ou se representa um trabalhador sindicalizado que está em manif na Av. da Liberdade. O mesmo se diga de Louçã cuja lata política é tanta que se dispensa de receber delegações de Países estrangeiros com a justificação de que não são verdadeiras democracias, quando ele em 1974 era apologista dos piores regimes totalitários de que a história guarda memória do martirizado séc. XX - que conheceu duas guerras mundiais.
E tudo é vaidade e vento que passa, como diria o Eclesiastes...