quinta-feira

Agostinho da Silva. Um mestre, de "dentro". Outro de sempre

Há pessoas que nasceram com o dom de imaginar e quase até diria com o dever de imaginar: porque, em virtude de qualquer disposição superior que nos escapa, a vida lhes transcorre tão fixamente no mesmo lugar e tão vazia de acontecimentos que na realidade a única possível existência para eles é a do sonho. Quanto a mim, se dispuseram os fados de outro modo: acho que por excesso de vida exterior, o imaginar me ocorre tão delgado que apenas consigo narrar o que vi, ouvi e senti; e, à primeira situação difícil que se me depara na vida, tenho logo de recorrer ao conselho dos meus amigos para que me desenvencilhem da situação; a menos que a própria vida se não encarregue de o fazer, coisa que tem sucedido, mas quase sempre com um desembaraço meio brutal que, para dizer a verdade, me não agrada nada. De vez em quando penso nisto, ou, como diz gente na minha terra, "magino" disto; porque, pelo que se refere a pensar, abstracta e discursivamente, não vai por aí o meu gosto. De qualquer modo, sucede que hoje pensei nisto, entre muitas coisas que tenho pensado neste quarto de hospital.

in Agostinho da Silva, Herta, Teresinha, Joan