segunda-feira

A organização da actividade dos media e a selecção do gatekeeping na mediacracia lusitana

Hoje decorrerá mais um Prós & Contras, desta feita sobre temas ligados à Capital e às condições que levaram à ruptura das condições (precárias) de govrnabilidade em que aquela estranha aliança assentara: entre Carmona e Zezinha Avillez Nogueira Pinto (patrocinada apelo líder do psd, MMendes, o mesmo que ainda mantem A. Preto como deputado na AR). Uma coisa quase contra-natura, apesar de se tratarem de dois elementos oriundos de famílias políticas convergentes ou, pelo menos, ditas de direita, o psd e o cds/pp. A origem do conflito é conhecido, um lofo nutrido por tachos municipais impostos por Mendes a Carmona vetados por zézinha Avillez. Como consequência, a aliança na Capital esfrangalhou-se, e agora Carmona para governar terá de "andar ao tio ao tio" para negociar - (caso a caso) - com o ps as medidas políticas que pretenda implementar para a cidade.
Este é o quadro político com base no qual o Prós & Contras de dona Fátima logo à noite irá para o ar. Creio que estarão em estúdio os seguintes intervenientes: Carmona, o ausente Carrilho e a dama de honor Zézinha Avillez - que fez ou rompeu com a aliança - muito em resultado da sua crónica desmedida ambição pessoal (só comparável à de fujão barroso), embora a mesma queira dissimulá-la sob a capa das suas preocupações aos interesses da cidade. Mas não consegue porque a máscara caai-lhe fácilmente.
Contudo, o objecto desta reflexão tem outro objectivo: indentificar as regras que norteiam as direcções de informação para a selecção de determinados factos e o convite de certas pessoas no quadro de determinada conflitualidade pessoal ou institucional. Pelo que aqui esta questão de Lisboa aparece apenas como um epifenómeno duma questão maior de que os media em geral são responsáveis: empolar situações dramatizando excessivamente, convidar pessoas sem espessura intelectual, densidade política ou até sem a representatividade suficiente para ter essa condição, dado que muitos outros ficam de fora desse acesso que têm mais legitimidade e até mais espessura intelectual. É manifestamente o caso de vereadores independentes ou patrocinados pelo BE por comparação zezinha Avilez - que até no dn aparece de forma atravessada, quiça a simbolizar aa maneira como de facto está na vida política, sempre em bicos de pés e tentando dar um passo maior do que as suas pernas, curtinhas por sinal.

Dito isto, vamos à teoria geral. O que creio passar-se na direcção da rtp - designadamente com o Programa Prós & Contras (e muitos outros noutras estações) é um fenómeno de gatekeeper, ou seja, uma selecção de notícias e de decisões para admitir e para excluir factos, opiniões e pessoas. Daí o termo "gate" (portão) para só deixar entrar o que alguns pretendem e jogar borda fora aqueles outros que as respectivas direcções de informação rejeitam. Se atentarmos bem nessa selecção - por vezes até mui parola além de salazarenga - constata-se que o Prós & Contras de dona Fátima usa e abusa desse critério de paróquia, o que só lhe fica mal além de não ser representativo do país e dos interesses particulares que possam estar em jogo.
Apesar de compreensivo o convite a zezinha Avillez para o programa - dificilmente se compreende que a mesma esteja na "bancada central", salvo pelo show of da senhora (leia-se, peixeirada em que a própria é expert). É sempre muito discutivel a sua presença com aquele destaque se comparado com o valor intelectual e político doutros vereadores ou doutras formações partidárias igualmente representadas na autarquia. E é aqui que a democracia local denota um "cancro" no seu funcionamento.
Pergunto-me porque razão estas pequenas heresias acontecem amiudadas vezes neste programa e noutros na mediacracia em Portugal? Será por maldade, por capricho, por simpatia e afinidade para com certos convidados e aleivosia relativamente a outros, por mera estupidez natural e impreparação cultural, científica, técnica? Creio que há um misto de todos estes ingredientes na composição dessas escolhas e dessas opções editoriais de que, naturalmente, dona Fátinha Campos Ferreira é autora. Muito embora ela se preocupe em dar uma imagem de grande diversidade, de grande pluralismo - quando a máscara cai nota-se, contudo, um tique que permite supôr a antítese da imagem que procura promover de si junto da majestade da opinião pública.
Todavia, essas opções editoriais não se esgotam apenas na personalidade e nos ódios de estimação das pessoas envolvidos na configuração desse gatekeeping, mas noutros factores mais complexos, dado que sem um filtro que ajude a criar rotinas e padrões de selecção nesse mercado qualquer jornalista/editor responsável cairia numa excitação paralisante que é sempre de evitar, como ensinou um dos papas desta área, Walter Lippmann. Mas convidar zezinha Avilez paraa bancada central do Prós e Contras - atendendo à sua microscópica representatividade política é, de facto, atribuir uma desmesurada importância social e política a quem, de facto, não a tem, e é aqui que os erros da mediacracia se reproduzem neste ciclo da violência informativa gerado em Portugal - e de que o prós & contras que tem inegáveis virtudes) também é um elo duma cadeia pernicioso da democracia mediática em Portugal.
E porquê? Porque deixa de mediar bem o que se passa entre o "nós" e a reaalidade "out there" que é suposto uma estação de tv saber mediar.Cometendo erros destes, os media em geral - e já não apenas a rtp - (ainda recentemente acusada pelo PR, cavaco Silva pela miserável cobertura que deram à sua declaração sobre o agendamento do aborto) - deixam de reflectir as diferentes atribuições e propósitos das populações e do país real. O tal que pensa mas é mudo porque não tem acesso aos media - que senhoras de pequeno porte político como zezinha Avilez gozam.
Por outro lado, o papel de neutralidade da estação de tv que desenvolve este acumular de erros acaba por se perder, porque as negociações, as simpatias, os caprichos e mais um complexo de motivações se interpõem entre a decisão e o convite de uns em desfavor da exclusão de outros, porventura bem mais interesantes do que pessoas que estão na política, como a dita zezinha, apenas para se promoveram a si próprias e ao seus objectivos particulares, por regra incompatíveis com o interesse geral. Aqui ela é igual a durão barroso, sLopes e a muitos outros que ainda não descobriram o que é o bem comum que falava o Aristóteles.
E é aqui, mais uma vez, que as donas Fátinhas que pululam por esse Portugal mediacrático reproduzem e amplificam erros evitáveis. A saber:
  • O de perderem a função de janela dos acontecimentos (porque ela tem os vidros sujos e assim perturbarem a visão dos verdadeiros acontecimentos);
  • Deixar de reflectir como um espelho os eventos da sociedade e do mundo - visto que a sua reflexão é inquinada e parcial ab initio, além de que os ângulos e a direcção dos enunciados é decididos pelos mais incompetentes e não pelos melhores;
  • A função de filtro e de gatekeeping está gripado à nascença - apesar de dona Fátima estar plenamente convencida do contrário, tamanha a sua alienação e convencimento;
  • O seu papel de guia/intérprete e de sinalizador também não é o mais credível - por vezes tirando a palavra a quem a merece e atribuindo-a a quem não a merece - fragmentando, assim, a narrativa global dos acontecimentos que seria suposto narrar;
  • A ideia de fórum amplo, global e representativo fica minado, logo amputado e nem sempre as palminhas das audiências são espontâneas e genuinas;
  • E, por fim, o interlocutor entre o debate e o público nem sempre responde ao verdadeiro debate que se procurou ter mas à própria interacção entre os actores do teatro, ou seja, entre os figurantes de que Zezinha Avillez é apenas uma peça do convite de dona Fátima.

Infelizmente, são algumas destas imagens que tecem as teias da mediacracia hoje em Portugal. Reproduzindo mundos sem importância, empolando e projectando pessoas cujo perfil e objectivos remete mais para o empresariado e a obtenção de lucros e não o verdadeiro interesse público, omitindo valores, ideias e pessoas que verdadeiramente poderiam dar melhores contributos ao país e, assim, por causa dos caprichos daquele gatekeeping corporizado pelas direcções da mediacracia - acabam por ficar esquecidos no baú do silêncio. Mas quem perde é o país.

Mas só come quem quer, como diz o povo. Para tal, teremos todos de compreender que os media são um negócio. O negócio do tráfico das atenções, das persuasões, da opinião e dos comentários, da influência dos comportamentos para ganhar share e quota de mercado Pub., para estruturar a realidade consoante as suas cosmovisões, arrecadando lógicas de estatuto, corrompendo a sociedade naquilo que ela tem de mais verdadeiro que a cada momento se oferece à discussão e ao debate público.

E é por isso que evocámos aqui, uma vez mais, Jorge Luís Borges, que nos mostra aquilo que os cientistas sociais (sociólogos, politólogos e os avençados da política, sejam deputados, vereadores e conexos) de facto, não nos mostram. E aquilo que pretendemos ver são as diferenças entre comentários e verdadeiros acontecimentos, entre a subjectividade e a objectividade, entre a mentira e a verdade, entre esta e as pressões constantes que a mediacracia de serviço é objecto por parte de grupos ou de interesses económicos e a influência perniciosa de partidos acerca do que deve ser (ou não) a orientação política da imprensa.

E aqui MMendes - do psd - já tem um certo historial de manipulação e de condicionamento da direcção de informação da rtp ao tempo de Cavaco - quando ainda lhe chamavam o "laranja mecânica", porque o seu trabalho era reconhecido e produtivo. Hoje, ao invés, parece que só é reconhecido pelo deputado a.Preto e mais uns quantos dentro do psd, e afigura-se pouco produtivo ante os olhos da opinião pública. Assim, nem em 2020 chegará a PM, embora possa ser o eterno nº 2 de qualquer nº 1.

É também para isso que serve a evocação das sábias palavras de Jorge Luís Borges (e também de Sudjanski - que de Marrocos nos manda notícias acerca do negócio dos camelos) - que nos ajudam a perceber que a passagem dum universo de meios finitos, os mass media, para um de possibilidades infinitas, coloca, necessáriamente, não só questões relativamente ao que deverá ser o posicionamento dos mass media face à sociedade (e à Internet em geral, leia-se também a blogosfera), mas também sobre como nos orientarmos num espaço que se assemelha mais à Biblioteca de Babel de Jorge Luís Borges, um núcleo onde se procura um princípio orientador, que já não encontramos em qualquer das bibliotecas municipais ou universitárias a que tenhamos acesso.

A obra de Camona & MMendes em Lisboa