terça-feira

Madre Teresa de Calcutá e o Mundial de Futebol

A Madre Teresa de Calcutá foi, talvez, a mulher que para mim mais importância teve no séc. XX. Freira passou a sua vida a trabalhar entre os pobres de Calcutá, e é hoje frequentemente citada como exemplo perfeito de altruísmo, o que contrasta com o mundo canalha que nos rodeia na vida civil do nosso quotidiano. Mas é óbvio que a Madre Teresa tinha um interesse no culto desse altruísmo: o de ser recompensada no Céu. E em 1979 recebeu o Prémio Nobel da Paz. Mas o objecto deste post não é descrever a sua trajectória, mas somente reflectir um pouco sobre a própria Natureza Humana, seguindo o filão que Tomás Hobbes nos legou. E legou bem: Não pode haver maior argumento para um homem, provando o seu próprio poder, do que saber-se capaz não só de realizar os seus desejos, como ainda de ajudar outros homens nos seus: e é nisso mesmo que consiste a concepção do que se chama caridade. Vem isto a propósito de um sonho que tive a semana passada, em que a selecção nacional se defrontava com dificuldade contra a selecção brasileira. Sucede que nesse jogo, motorizado pelo sonho, o árbitro era quem? - imagine-se!!! - a própria Madre Teresa de Calcutá, que corria como uma xita assinalando faltas a torto e a direito, mas mantendo sempre a ordem dentro das quatro linhas. Talvez com receio de perdermos o meu subconsciente importou alguém portador dum forte poder simbólico para nos ajudar em caso de dificuldade. Regressando à realidade: o Brasil ficou pelo caminho, e bem, e a Madre Teresa nunca arbitrou jogos de futebol. Provavelmente, ao meu receio de perdermos a partida somou-se alguma dose de egoísmo psicológico a fim de satisfazer a tal esperança de virmos a ser campeões do mundo de futebol no preciso momento em que a economia portuguesa está de rastos e vive uma recessão económica, social e moral doentia e sem escapatória à vista. No fundo, toda esta energia colectiva, toda esta psicose multitudinária para quê? Creio que também aqui o legado de vida de Madre Teresa é fecundo, já que a sua própria caridade revela, assim, o prazer de cada um na demonstração dos seus próprios poderes. Sucede-me por vezes dar comigo a pensar que motivo me anima quando compro um bolo a um homeless, ou dou um pacote de leite a um pedinte à boca duma igreja. Julgo que haverá aqui uma certa dose de egoísmo da minha parte, mas que é universal da própria condição humana, e, por outro lado, temos de provar ao mundo que um homem caridoso está a provar a si mesmo, e ao mundo, que possui mais recursos que os outros. Neste aspecto a Madre Teresa foi talentosamente egoísta. Já que não cuidou só de si mesma, nem do seu Prémio Nobel da Paz, muito justo, aliás, mas também cuidou de atender aos outros. Outros que não tinham a mesma capacidade do que ela para se proverem no dia-a-dia. Dito doutro modo: a Madre Teresa apenas exibiu a sua superioridade - ética, moral e também política. É isso, creio, que a selecção portuguesa deverá fazer contra os franceses, e depois reforçar a dose e "limpar" o mundial. Facto de que estou firmemente convencido. Provando que conseguimos ganhar mesmo sem ter a Madre Teresa de Calcutá como árbitro. Até porque o Brasil já ficou pelo caminho e, provavelmente, nunca mais repetirei outro sonho em que o player principal era a Madre Teresa desempenhando o papel de árbitro num Portugal-Brasil. Conclusão: estes sonhos dão comigo em doído provando, também, que caí na ratoeira que dizia escapar: o futebol alienou-me. E hoje penso como o Figo, só não ganho como ele... E o mais preocupante é que esse critério é capaz de se aplicar a mais 10 milhões de portugueses.
  • Nota: dedicamos esta reflexão a três pessoas: à Madre Teresa, naturalmente, à selecção nacional (que é uma instituição) e ao meu tio - autor do Memórias Futuras - que parece ter apanhado uma febre macaca que não o larga. Provavelmente, também anda a ter pesadelos com a Madre Teresa, mas com outras finalidades e talvez fora das quatro linhas...