quinta-feira

Crimes de Verão (nos Pastéis de Belém)...

O Verão está aí mas o que de pior tem o mundo não se molde à tonalidade do tempo, persiste na malvadez, como se ela fosse uma característica tão permanente quanto estruturante da condição humana. Logo, o crime não escolhe estações, e o caso que está a "drogar" a opinião pública mundial (leia-se, o caso Madeleine) constitui já um desafio aos cérebros mais hiperactivos na busca de respostas plausíveis que desmonte - peça-a-peça - o que efectivamente se passou. Mas os papás da menina parecem não estarem a ajudar muito, como deviam. Um casal de médicos - cujo passado e relação com os pacientes no seu país deveria ser investigado a pente fino, a fim de excluir hipóteses de vingança, ressentimento ou outras na relação médico-paciente que daí pudesse resultar nesta teia de omissões. Se fosse em Portugal muita gente já teria "despachado" essa aberração do ministro da Saúde...

Este clima de Verão não é bom, mas temos de o enfrentar, sendo que um crime, qualquer que ele seja, apresenta sempre uma racionalidade em função do seu autor o considerar em virtude dos resultadaos imediatos ou das suas consequências mais longínquas.

O assalto à mão-armada, por exemplo, rende imediatamente uma soma avultada, mormente se o "artista" tomar por alvo um turista com uma boa máquina fotográfica... Talvez em Alfama hajam tantos gritos e corridas de 300 m... São os turistas a gritar e os "artistas" a fugir por aquelas ruelas escorregadias que registam tudo mas não contam nada à polícia.

Mas esse mesmo assalto à mão armada pode revelar-se indesejável a médio e longo prazos, porque essa acção comporta uma sequência estrutural (do furto), da violência que pode servir para atender um vício (toxicodependência, sexo ou outro, como a pedofilia...).

Ou seja, um criminoso, tal como a generalidade dos cidadãos, vive a crédito, com a agravante de poder ir parar à cadeia a qualquer momento. Ele pode aproveitar-se do curto prazo mas no longo prazo ele vive prisioneiro da sua própria consciência, encerrado em si e num sobressalto permanente que o leva a uma ansiedade por saber que pode ser preso a qualquer momento.

E é esta miopia temporal que não lhes permite governar racionalmente as suas vidas, e por causa disso destroem a vida dos seus familiares e arrastam a dos amigos que, em certos casos, até era suposto potegerem.

A esses trastes da sociedade deixamos aqui uma indicação menor: quando quiserem praticar um crime vão alí aos pastéis de Belém, peçam meia dúzia daquelas amostras, que também já não são o que eram, e no final pirem-se, pois com as filas de turistas mesmo que as pessoas queiram pagar não conseguem. E depois sempre têm o pretexto de se justificar de que quem rouba para comer é só meio criminoso.

E se os forem comer para a frente do portão do Palácio de Belém ainda poderão ter a chance de ver por lá o Cavaco a entrar (ou a sair) e poder partilhar com ele um pastelhinho de Belém, tão apreciados por Soares que os comia às dúzias, e, admitamos, ver Cavaco a comer bolo-rei já era engraçado, vê-lo a manjar uns pastelinhos de Belém é capaz de ser curioso.

No final, vai tudo para a pildra prestar declarações por estar alí a manjar os pastéis de Belém gamados minutos antes naquela Casa centenária. Tudo por causa dos turistas (que não os deixaram pagar)...

E por causa dos "turistas" a imagem externa de Portugal também está pagando uma factura pesada, porque o que o país precisa é de Investimento Directo Estrangeiro (IDE) de qualidade e não "estórias" de crime macabro que vegetam entre a pedofilia e a malvadez desta condição humana que, pelos vistos, rumou em direcção ao Sul...

Pergunto-me, um pouco cínicamente, se isto já não é uma telenovela artificialmente alimentada por todos os players com o propósito de dar pão e circo ao povo que, por não ter projecto de vida, precisa deste "sangue" nas vidas alheias para ir suportando a agrura dos seus próprios dias.

Enfim, crimes de Verão neste miserável canto lusitano à beira mar sepultado. Dissertar sobre zaramago (ainda) seria pior.