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Domingo, dia de Camões, de Portugal e das Comunidades

Não conheço nenhum português, deste ou doutros tempos, em pessoa ou em memória, que conheça melhor a personalidade colectiva do povo português do que Luís Vaz de Camões, que terminou Os Lusíadas com uma palavra que ainda hoje, para mal dos nossos pecados, continua a tolher-nos: a inveja.
Poderíamos aproveitar o dia para encontrar ideias, soluções ou concursos para erradicar essa "virtude" da maneira de ser nacional.. que tanto tem penalizado o Estado, a sociedade e as pessoas individualmente.
Pelos seus excepcionais ditos, narrativas gloriosas, feitos e legado comemora-se hoje o dia de Camões e das Comunidades Portuguesas, que deveria ser sempre durante a semana, porque, por regra, aos fins-de-semana chove e essa circunstância não convida à leitura de Luís Vaz nos bancos de um jardim radioso.
Recolhemos aqui um fragmento da sua valiosa Obra - sempre actual e portadora de lições que hoje bem poderiam reencontrar novo significado. Vejamos:
O NAUFRÁGIO Fim do estágio obrigatório na milícia do Oriente. Camões é nomeado provedor-mor em Macau, entreposto comercial de portugueses na China. É encarregado de arrolar e administrar provisoriamente os bens de pessoas falecidas ou desaparecidas. Lá, descobre uma estreita gruta, refúgio. Passa horas a escrever, Os Lusíadas: a viagem épica de Vasco da Gama e, no extremo sul da África, o gigante Adamastor a tentar impedir o avanço dos nautas portugueses:
«Eu sou aquele oculto e grande Cabo - A quem vós chamais de Tormentório.»
Heróis trágico-marítimos; deuses mitológicos, paixões, intrigas, batalhas, aventuras e cobiças.
Histórias de um minúsculo Portugal em expansão, «mais do que prometia a força humana»...
Não tarda e é acusado, por compatriotas, de apropriação de dinheiro alheio. Camões tem de ir a Goa para responder a inquérito judicial.
Obs: Hoje ao tentar soldar alguns fragmentos da nossa história colectiva chego à miserável conclusão que os 10 milhões de portugueses, à semelhança de Luís Vaz e pelas dificuldades várias que sentem no seu quotidiano, também poderiam andar por aí a responder por crimes vários e múltiplos. Crimes por acção e omissão, ligados à nossa maneira de ser, mas a ideia que desejaria sublinhar é que nem o passado já nos permite rever a história, mas é o sacana do Presente que nos dá aquilo de que nos lembramos - e é essa massa que passa a ser a verdadeira história. Logo, a vida não é o que vivemos efectivamente, mas aquilo de que nos lembramos e como o lembramos, como diria Gabu.
Infelizmente, também somos um povo com fraca memória, e a que temos é sempre curta. Dos quatro grandes vultos das nossas Letras - Camões, Vieira, Eça e Pessoa - talvez só Eça tenha granjeado o devido sucesso em vida. O resto foi tudo corrido a estátuta post-mortem, e o Pessoa - segundo as rezas do tempo não passaria dum bebedolas que dormia no Martinho da Arcada a escrever poemas e cartas para Ofélia - e que até foi chumbado num acesso num exame de de admissão para bibliotecário com o fundamento de que dominava mal a língua portuguesa. Como a vida é irónica, não é!!!
O dia de Camões, na minha opinião, deveria servir para pensarmos nestas merdinhas e, ao mesmo tempo, tentarmos encontrar formas e fórmulas de as ultrapassar. Mas também somos uns nabos, pois o 10 de Junho serve para engarrafamentos e mais engarrafamentos - dentro e fora do Allgarve, além dos discursos de circunstância por parte dos agentes políticos - que lá recitar mais meia dúzias de frases feitas. Originalidades.., Nada!!!.
O Macro deixa aqui uma sugestão, provavelmente tão comezinha quanto útil: voltar a reler Camões pela pena de João de Barros - contado às crianças e lembrado ao povo.
Pegar naquele calhamaço e voltar a ler a Obra em estrofes sempre foi para mim um grande xarope, prefiro prosa.