quinta-feira

António Vitorino fala-nos dos novos inimigos da "sociedade aberta"

Ontem Cavaco e Silva (como alguns dizem fez um discurso muito apelativo aos jovens, incentivando-os a participarem e a não se resignarem. Só não disse através de que mecanismos esses mesmos jovens podem participar nesse vácuo que é hoje Portugal. Mas o discurso foi bonito e bem lido, mas talvez fosse mais útil que o discurso resultasse mais da própria praxis política e não da leitura de textos anualmente rotinados, muitos dos quais nem sequer são elaborados pelo próprio.
Hoje António Vitorino, reportando-se à qualidade e necessidade da pureza da democracia que temos de saber cultivar falou-nos de dois inimigos da democracia e do pluralismo que andam por aí: o racismo e a xenofobia - de que, acrescento eu, a estória daquele cartaz manhoso do PNR estrumado no Marquês de Pombal e alguns sinais ejaculatórios precoces de organizações neofascistas em busca de poiso para fazer uma conferência, representam pequenos marcos desses perigos. E o mais deprimente é que o cartaz do gato Fedorento foi legalmente e camaráriamente removido (é certo que o quarteto de humoristas têm criticado Carmona e o PsD, terá sido por isso... creio que sim!!) enquanto que o outr, verdadeiramente atentatório dos nossos valores morais e políticos - ainda permanece lá, sob a cumplicidade velhaca e incompetente do sr. Carmona - que deve aguardar a decisão do Tribunal e da doutrina rara de alcova ali produzida.
No fundo, a história vai-se repetindo, mas sob novas roupagens de sociedade fechada, como diria Karl Popper - que via nas tribos, nas forças mágicas, no surgimento de forças reaccionárias, enfim, de pequenos totalitarismos em potência os verdadeiros inimigos da sociedade aberta e da própria civilização.
No limite, poderemos ver na xenofobia e nas manifestações de racismo a reprodução totalitária perigosa e questionante da civilização Ocidental, mas também uma leitura económica do problema, já que a não criação duma sociedade de pleno emprego, como diria John M. Keynes, capaz de absorver e de integrar todos os elementos na sociedade post-industrial gera os tais resíduos que depois se organizam - reactivamente - nestes excrementos que a democracia pluralista tem de saber tolerar.
PS1.: Para Popper os inimigos da sociedade aberta eram Platão, Hegel e Marx e escreveu dois Vols. para o ilustrar, com algum exagero, presumo. Pois ao tempo de Hegel e de Marx - muito menos de Platão (o homem dos ombros largos e fiel intérprete de Sócrates) não se conseguia prever a fisionomia da civilização contemporânea, definida pelas aspirações humanitárias e pelos seus ideais de racionalidade, igualdade e liberdade - entre outras "maldades" da Revolução Francesa e da Revolução norte-americana 10 anos antes, em 1779.
2. Ainda hoje esses valores vivem a sua infância, mas os rapazolas da extrema direita que julgam que é a imigração de africanos, brasileiros e pessoas oriundas do centro e leste europeu que hoje vivem e trabalham em Portugal - e aqui pagam os seus impostos para o Estado construir pontes, estradas, hospitais e escolas (que também servem os interesses daqueles neofascistas de trazer por casa) - é que lhes rouba os empregos.. Pura ilisão!!! Isto não passa dum pretexto para abrir uma frente de guerra social que as forças políciais em Portugal souberam aplacar.
3. Hoje de manhã António Vitorino sublinhou estas preocupações na Linha da Frente (rúbrica radiofónica na TsF) tendo por referência o racismo e a xenofobia no quadro da qualidade da democracia que buscamos, volvidos 33 anos do 25 de Abril. Motivo mais do que suficiente para recuperarmos aqui Karl Popper e algumas das suas angústias acerca da teoria platónica da justiça bem como da teoria e praxis do totalitarismo moderno, nem que seja para que possamos sentir a urgência de uma reinterpretação daquilo que pode (e deve) ser a democracia política, social, económica e cultural portuguesa (e europeia) no actual quadro de globalização competitiva em que vivemos.